Fundações de edifícios: etapa da obra “que não se vê” é a que assegura estabilidade do empreendimento
Ao observar um edifício, especialmente as construções mais altas e com vários pavimentos, você já parou para pensar em como é possível manter no lugar os arranha céus, mesmo com a movimentação natural do solo? Antes de erguer um empreendimento, a construção tem como uma das etapas iniciais a fundação, uma fase da obra que não é vista, mas que representa o alicerce da edificação.
Intervenção feita no subsolo, parte estrutural e mais essencial do empreendimento, a fundação é uma etapa desenvolvida a partir do estudo de geotecnia do terreno, para que seja garantida a distribuição adequada do peso da construção no solo, evitando riscos de deslizamentos de terra, danos nos empreendimentos e prédios vizinhos, como trincas, rachaduras nas paredes e até o mais grave: desabamentos.
Na fase de fundação, devem ser feitos testes para avaliar e mensurar a qualidade das estruturas das fundações dos empreendimentos, incluindo a prova de carga, que, embora seja uma exigência das normas técnicas da Construção Civil, ainda é feita, com o máximo critério, por poucas construtoras do país.
Em Curitiba, a AGL adotou a “prova de carga” como etapa obrigatória de todas as obras. De acordo com o engenheiro civil, especialista e mestre em Geotecnia e diretor da incorporadora, Luiz Antoniutti, a medida de presciência considera eventos climáticos cada vez mais extremos. “Em décadas de estudos e experiência em fundações, já nos deparamos com solos orgânicos, argilosos, arenosos, difíceis de fazer escavações, que necessitam contenções mais ou menos pesadas. Existem terrenos que também podem estar em regiões mais altas, com menor ou maior nível de água, com necessidade maior ou menor de escavações. Tudo precisa ser analisado, inclusive fatores como as mudanças climáticas e a necessidade de se antecipar a eventos extremos, que resultam em movimentação atípica do solo. Há muito estudo e diferentes tecnologias e profissionais envolvidos no processo da fundação, que é uma etapa da qual não se abre mão da excelência”, explica.
O objetivo principal da fundação, segundo o especialista, é dar estabilidade e segurança à edificação, a fim de dar suporte e transmitir os carregamentos para o terreno. O ponto de partida é a análise criteriosa sobre o tipo de solo, características do terreno e outros fatores que influenciam a estabilidade de taludes (planos de terrenos inclinados, que podem ser naturais ou planejados e são capazes de garantir a estabilidade de um terreno) e exigem cuidados extras em função dos riscos de deslizamento ou movimentações de terra.
O “passo a passo” das fundações
O “passo a passo” da fundação de um edifício, seja ele comercial ou residencial, começa no momento em que a equipe se depara com a oportunidade e precisa tomar ciência das características do terreno e condições do contorno, segundo o engenheiro. “Fazemos essa sondagem geotécnica para entender os desafios do solo que será escavado. Depois, é preciso entender como o projeto e o terreno estão inseridos na vizinhança. Tem drenagem? Tem rio próximo? Tudo isso é muito importante analisar”, diz.
A equipe se dedica, então, a reunir a maior quantidade de dados possível sobre o terreno: topografia, informações sobre os projetos vizinhos e, então, passa a fazer uma investigação geotécnica de qualidade. Nesse momento, é contratada uma empresa especializada na etapa da função para realizar a sondagem e a investigação apurada do solo.
Como terceiro passo, já com os elementos mencionados em mãos, é a hora de escolher um projetista competente nas áreas de fundações e contenções. “Ele vai analisar todos os dados do projeto arquitetônico e de estruturas e fazer um laudo, que vamos analisar criteriosamente. Depois, contratamos um trabalho de análise técnica do projeto com o objetivo de agregar ainda mais valor a ele e descobrir desafios que, eventualmente, não foram considerados ou compreendidos até então. É como se fosse uma segunda checagem. A escolha de bons profissionais e de empresas especializadas em cada etapa é fundamental”, reforça o engenheiro.
Cumpridas as etapas da fundação, a AGL faz ainda os ensaios de integridade ou ensaios PIT , que avaliam a resistência e a integridade estrutural das estacas. Ao contrário de vigas e pilares aparentes, que podem ser vistas após a colocação, as estacas ficam embutidas no solo. Por isso, a avaliação da integridade das mesmas e identificação de possíveis problemas de concretagem é feita por meio da medição de velocidade de onda gerada por um golpe de martelo manual. “Fazemos em todas as estacas, sem exceção, os chamamos de ‘ensaios de integridade estrutural’. Se alguma delas não estiver devidamente concretada, conseguimos auscultar e corrigir. É um ensaio mais simples, mas muito eficiente”, detalha.
Por fim, a prova de carga é um procedimento que testa, com carga real, a adequação das estacas ao peso futuro da construção. “Avaliamos, na prova de carga, se a estrutura suporta toda a carga do edifício que será erguido sobre ela. Nos testes, levamos às estacas duas vezes mais a carga de trabalho delas. Se tivermos uma estaca de 100 toneladas, por exemplo, vamos fazer a prova de carga para 200 toneladas. Com isso, aplicamos a carga e medimos o comportamento da estrutura. A prova de carga é um elemento que pode custar de R$30 mil a R$100 mil, dependendo da obra, ou até mais. É um valor considerável, mas necessário, dos prédios mais baixos até os mais altos”, completa.
Curitiba: edifícios cada vez mais altos nos eixos estruturais
Com mais de 40 prédios com alturas superiores a 100 metros, Curitiba (PR) é uma cidade com tendência de construção de edifícios cada vez mais altos nos eixos estruturais previstos na nova Lei de Zoneamento e Uso do Solo (2020). Os empreendimentos super altos se concentram nos entornos de avenidas como a Sete de Setembro, João Gualberto, no Juvevê, e novo eixo do Ecoville ou Mossunguê.
Na Região Sul da cidade, a tendência é de intensa verticalização, nos bairros Água Verde, Portão e Novo Mundo, que concentram o maior volume de alvarás para a construção de edifícios. De 2021 a 2023, foram autorizadas as construções de mais de 100 empreendimentos de habitação coletiva nos três bairros.
De acordo com Antoniutti, todas são obras que exigem a mesma idoneidade das fundações de edifícios super altos. “Em termos de técnicas, os procedimentos são os mesmos. Algumas coisas são mais complexas e exigem uma atenção maior aos detalhes, como a investigação das características dos terrenos e a etapa da concretagem de blocos de fundação, que tendem, nesses casos, a serem ainda maiores. Construir edifícios super altos aumenta a complexidade e o tempo da obra, mas o passo a passo, as etapas, são as mesmas e não permitem economia nos projetos e controles. A estabilidade tem um custo e esses investimentos tendem a agregar ainda mais valor aos empreendimentos, além de evitar muitos problemas”, pontua.
A AGL tem, em construção, dois empreendimentos com mais de 20 pavimentos: o New Urban, no Novo Mundo, que está 95% pronto e tem 25 andares, e o Kóra, no Portão, que terá 20 andares e está na etapa de projetos e investigações. A prova de carga será feita antes do início efetivo das fundações. “É um aspecto diferencial deste empreendimento. Vamos antecipar essa etapa das provas porque a região em que o empreendimento vai ficar localizado é mais central, tem mais edifícios vizinhos. E para garantir o máximo cuidado com o entorno, optamos por seguir este caminho. Além disso, no Kóra, vamos preservar uma araucária. Para isso, faremos contornos com cortinas de contenção e tomaremos cuidados adicionais para que as fundações não atinjam as raízes da árvore. É um projeto que envolve mais custos para ser feito, mas ao mesmo tempo é um desafio positivo para a nossa equipe”, conclui.